segunda-feira, 28 de maio de 2018

Ainda a propósito - "A injecção atrás da orelha"



O meu Pai faleceu há 7 anos.
Enquanto o meu Pai andava por cá havia discussões acesas entre mim e ele a propósito da possibilidade de se colocar um ponto final na vida. Estas discussões ocorreram há muitos anos, ainda o termo “eutanásia” não tinha o significado que hoje tem (ou que lhe pretendemos atribuir). O meu Pai dizia muitas vezes que “chegando a uma fase da nossa vida em que andamos por aqui a vegetar, o melhor será darem-nos uma injeção atrás da orelha como se faz aos animais”.
Nas suas últimas horas de vida, (o meu Pai tinha Parkinson) ao vê-lo prostrado naquela cama de hospital, dei comigo a pensar que às tantas ele até tinha razão quanto à “injeção atrás da orelha” porque não havia dignidade alguma naquele estado semi-vegetativo.
Acariciei-lhe a face esquerda e desci as escadas do hospital a pensar que tinha que o ajudar a partir em paz. Fiz dois telefonemas: um para um familiar e outro para a Adelina a quem pedi para o ajudar a partir em paz.
O meu Pai partiu naquela madrugada de 10 de fevereiro de 2011. E penso que o fez pacificado e  INTEIRO.
A vida do meu Pai foi uma vida cheia: cheia de família, de amigos, de jornais, de viagens. Cheia também de dificuldades e parca de dinheiro. O meu Pai viveu tudo quanto um Homem pode viver. Tudo quanto se pode ter de bom e de menos bom. O meu Pai viveu um casamento apaixonado de quase 56 anos (faltavam dois meses). Foi um Homem digno e respeitado por todos.
Passados 7 anos sobre a sua partida, continuo a achar que o meu Pai não tinha razão quanto “à injeção atrás da orelha”.
A dignidade da vida revela-se também na dignidade com que se parte; e não podem ser partidos políticos a decidir como e quando e onde tal partida acontecerá. E deixemo-nos de hipocrisias porque todos nós sabemos a prática corrente dos hospitais: paulatinamente as “máquinas” vão sendo desligadas e os medicamentos paulatinamente diminuídos nas doses respetivas.
Muito mais poderia dizer a respeito da eutanásia mas desejo terminar com a seguinte história:  no dia do funeral do meu Pai, a D. Judite, enfermeira aposentada e católica convicta e praticante, do alto dos seus setenta e muitos anos disse-me que “a vida é uma linha reta e infinita. Num determinado momento, aparece uma pequenina curva e depois a linha continua reta e invencível. A pequenina curva é a passagem para o outro lado onde tudo continua”.
Acredito que a vida e a morte são a linha reta da D. Judite e não compete a ninguém a sua interrupção voluntária, pois, conforme já tive oportunidade de expressar, a vida é um Dom, Única,  Una e Intransmissível.
Quando encarnamos, o nosso “chip” tem impresso tudo quanto temos que experimentar e até o modo do nosso regresso à Vida Superior – Determinismo. Obviamente que temos sempre a possibilidade de escolha – Livre Arbítrio. É inegável! Assim como é inegável o ajuste de contas!

A semeadura é livre. A colheita é obrigatória.

Elisabete Pinho



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